Espalho coisas sobre um chão de giz
Ah, meros devaneios tolos a me torturar!
Fotografias recortadas em jornais de folhas, amiúde…
Eu vou te guardar num pano de guardar confetes
Eu vou te jogar num pano de guardar confetes
Disparo balas de canhão
É inútil pois existe um grão-vizir
Há tantas violetas velhas sem um colibri
Queria usar, quem sabe, uma camisa de força ou de vênus
Mas não vou gozar de nós apenas um cigarro
Nem vou lhe beijar, gastando assim o meu batom
Agora pego um caminhão, na lona vou a nocaute outra vez
Pra sempre fui acorrentado no seu calcanhar
Meus vinte anos de boy, that’s over baby! Freud explica
Não vou me sujar fumando apenas um cigarro
Nem vou lhe beijar gastando assim o meu batom
Quanto ao pano dos confetes, já passou meu carnaval
E isso explica por que o sexo é assunto popular.
No mais estou indo embora, no mais estou indo embora
No mais...
Chão de giz, uma das principais canções de Zé ramalho, que muita gente admira e canta quando a ouve no rádio ou no barzinho, mas poucos entendem ou sabem o significado da letra tão complexa. Chão de giz é realmente espetacular, principalmente por contar uma história verídica que aconteceu com Zé Ramalho na juventude.
Ainda jovem, o compositor teve um caso duradouro com uma mulher bem mais velha que ele, casada com uma pessoa influente da sociedade de João Pessoa, onde ele morava. Ambos se conheceram no carnaval. Zé Ramalho ficou perdidamente apaixonado por esta mulher, que jamais abandonaria um casamento para ficar com um “garoto pé-rapado” que ela apenas “usava”.
Assim, o caso que tomava proporções enormes foi terminado. Zé Ramalho ficou arrasado por meses, mudou de casa, pois morava perto da mulher e, nesse meio tempo, compôs Chão de giz.
Sabendo deste pequeno resumo da história, fica mais fácil interpretar cada verso da canção.
“Eu desço dessa solidão e espalho coisas sobre um chão de giz” - um dos seus hábitos, no sofrimento, era espalhar pelo chão as coisas que lembravam o caso dos dois. O chão de giz indica como o relacionamento era fugaz;
“Ah, meros devaneios tolos a me torturar!” - devaneios e lembranças da mulher que não o amava, tinha-o apenas como amante para realizar suas fantasias;
“Fotografias recortadas de jornais de folhas, amiúde...” - hábito de Zé Ramalho de recortar e admirar TODAS as fotos dela que saiam nos jornais – ela era da alta sociedade, sempre estava nas colunas sociais;
“Eu vou te guardar/jogar num pano de guardar confetes” - pano de guardar confetes são balaios ou sacos típicos das costureiras do Nordeste, nos quais se jogam restos de pano, papel, etc. Aqui, Zé diz que vai jogar as fotos dela nesse tipo de saco e, assim, esquecê-la de vez;
“Disparo balas de canhão, é inútil, pois existe um grão-vizir” - ele tenta ficar com ela de todas as formas, mas é inútil, pois ela é casada com um homem muito poderoso;
“Há tantas violetas velhas sem um colibri” - metáfora poética. Há tantas violetas velhas (como ela, bela, mas velha) sem um colibri (um jovem que a admire), dessa forma ele tenta novamente convencê-la apelando para a sorte – mesmo sendo velha (violeta velha), ela pode, se quiser, ter um colibri (jovem);
“Queria usar, quem sabe, uma camisa de força ou de vênus” - verso que mostra a dualidade do sentimento de Zé Ramalho. Ao mesmo tempo que quer usar uma camisa de força para se afastar dela, também quer usar uma camisa de vênus para transar com ela;
“Mas não vou gozar de nós apenas um cigarro” - novamente ele invoca a fugacidade do amor dela por ele, que o queria apenas para “gozar o tempo de um cigarro”. Percebe-se o tempo todo que ele sente por ela um profundo amor e tesão, enquanto é correspondido apenas com o tesão, com o gozo que dura o tempo de se fumar um cigarro;
“Nem vou lhe beijar, gastando assim o meu batom” - para quê beijá-la, se ela quer apenas o sexo?
“Agora pego um caminhão, na lona vou a nocaute outra vez…” - novamente ele resolve ir embora, após constatar que é impossível tentar algo sério com ela. Entretanto, apaixonado como está, vai novamente à lona – expressão que significa ir a nocaute no boxe, mas também significa a lona do caminhão, com o qual ele foi embora – ele teve que sair de casa para se livrar desse amor doentio;
“Pra sempre fui acorrentado no seu calcanhar” - amor inesquecível, que acorrenta. Ela pisava nele e ele cada vez mais apaixonado. Tinha esperanças de um dia ser correspondido;
“Meus vinte anos de ‘boy’ – that’s over, baby! Freud explica” - ele era bem mais novo que ela. Ele era um boy, ela era uma dama da sociedade. Freud explica um amor desse (Complexo de Édipo, talvez?).
“Não vou me sujar fumando apenas um cigarro” - depois de muito sofrimento e consciente de que ela nunca largaria o marido/status para ficar com ele, ele decide esquecê-la. Essa parte ele diz que não vai se sujar transando mais uma vez com ela, pois agora tem consciência de que nunca passará disso;
“Quanto ao pano dos confetes, já passou meu carnaval” - Eles se conheceram em um carnaval. Voltando a falar das fotos dela, que iria jogar em um pano de guardar confetes, ele consolida o fim, dizendo que já passou seu carnaval (fantasia), passou o momento;
“E isso explica porque o sexo é assunto popular” - aqui ele faz um arremate do que parece ter sido apenas o que restou do amor dele por ela (ou dela por ele): sexo. Por isso o sexo é tão popular, pois apenas ele é valorizado. Ela só queria sexo e nada mais;
“No mais, estou indo embora” - a canção se encerra. É a despedida de Zé Ramalho, mostrando que a fuga é o melhor caminho e uma decisão madura.
Para saber mais sobre a história da canção, acesse:
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