Complexo de Roberto Carlos - A amizade e o fundamento subjetivo das redes sociais
[...] Tal complexo se caracteriza pelo desejo de ter um milhão de amigos no qual não está contido o desejo de ter um amigo verdadeiro, muito menos único. A impossibilidade de realização desse desejo é até mesmo física. Não seria sustentável para o frágil corpo humano enfrentar “um milhão” de contatos reais. Na base do complexo de Roberto Carlos está a necessidade de sobrevivência que fez com que pessoas tenham se reunido em classes sociais, famílias, igrejas, partidos, grêmios, clubes e sua forma não regulamentada que são as “panelas”. Um milhão de amigos, portanto, ou é metáfora de canção ou é fantasmagoria que só cabe no infinito espaço virtual que cremos operar com a ponta de nossos dedos como um Deus que cria o mundo do fundo obscuro de sua solidão. Complexo de Roberto Carlos, de Rei, ou de Deus…
Questão fantasmagórica
A questão é da ordem do imaginário e de sua eficiente colonização. Não haveria o que criticar nesse desejo de conexão se ele não servisse de trunfo exploratório sobre as massas. Refiro-me às empresas de comunicação digital que usam o desejo humano de conexão e comunicação como isca para conquistar adeptos. Amizade é o nome dessa isca. Mas o que realmente está sendo vendido nessas redes se a amizade for mais que isso? Certamente não é a promessa de amizade, mas a amizade como gozo: a ilusão de um desejo realizado. E quando um desejo se realiza? Apenas quando ele dá lugar à aniquilação daquilo que o impulsionava.
Logo, o paradoxo a ser enfrentado nas redes sociais é que a maior quantidade de amigos é equivalente a amizade nenhuma. A amizade é como o amor, que só se sustenta na promessa de que será possível amar. Por isso, quando se sonha com o amor, ele sempre é desejo de futuro, no extremo, de uma eternidade do amor. O mesmo se dá com a amizade. Um amigo só é amigo se for para sempre. Mas quem é capaz de sustentar uma amizade hoje quando se pode ser amigo de todos e qualquer um?
De todas as redes sociais, duas delas, Orkut e Facebook, usam a curiosa terminologia “amigo” para nomear seus participantes. Certamente o uso da palavra não garante a realidade do fato, antes banaliza o significado do que poderia ser amizade, como mostra o recente filme A Rede Social (The Social Network, 2010), dirigido por David Fincher. O filme não é apenas um retrato de Mark Zuckerberg, o jovem e bilionário criador do Facebook, mas uma peça que pode nos fazer pensar sobre o sentido que nosso tempo digital dá à amizade.
Mark Zuckerberg, como personagem do filme, é o sujeito excluído de um clube. Dominado pelo básico desejo humano de “fazer parte”, ele decide criar seu próprio clube. No filme, ele consegue ter milhares de “conectados” – na realidade o Facebook hoje conecta 500 milhões de pessoas ou “amigos” – e perder seu único amigo verdadeiro, Eduardo Saresin. A amizade é a básica e absoluta forma da relação ética, aprendida como função fraterna no laboratório familiar e na escola; ela é uma qualidade de relação. Tratá-la como quantidade é a autodenúncia de seu fetiche e de sua transformação em mercadoria. O valor do filme está em mostrar a inversão diante da qual não há mais nenhuma chance de ética: um amigo não vale nada perto de milhões, como uma moedinha que perde seu valor diante de um cofre cheio. Amigos transformados em números não são amigos em lugar nenhum, nem na metáfora de Roberto Carlos, que serve aqui para denunciar criticamente o mundo do qual somos responsáveis junto com Mark Zuckerberg.
[Por Marcia Tiburi, Texto Publicado na Revista Cult em 07 de fevereiro de 2011]
FRAGMENTOS DO FILME: [Fragmento-1], [Fragmento-2]
FRAGMENTOS DO FILME: [Fragmento-1], [Fragmento-2]
10 comentários:
Olá!!Bom dia Luiz!!
Muito pertinente este texto!!É a época das facilidades, do descartável...
Mas nem todo mundo usa desta forma, eu tenho o orkt e facebook, mas quase não uso,por falta de tempo...Mas tenho poucos amigos...a maioria é de familiares!!
Quantidade não é importante!
Gosto mais de mexer no blog, onde compartinho meu amor pela literatura...E vamos conhecendo pessoas com o mesmo interesse, o que é maravilhoso!!
beijos
bom domingo!!
Pois é, Luiz,o mundo digital aproxima pessoas, mas, também, tem muito faz de conta. Abraços
Olá, Luíz.
Vim matar a saudade do seu belo espaço e encontro, coincidentemente, um texto que trata exatamente do que eu e o meu marido falávamos ao tomarmos café-da-manhã hoje. rs
Como o mundo tá de pernas pro ar, via de regra, por conta dessas redes sociais. Isso tem mexido demais com a cabeça das pessoas e de forma muito negativa. O seu texto disse tudo!
Parabéns por essa belíssima postagem!
Um grande abraço e um excelente domingo pra vc! :)
Ola obrigado pelo seu comentario no meu blog :), mas eu tive um problema e nao recebi as respostas das perguntas, nao sei o que aconteceu gostaria que voce mandasse novamente pf se puder para o meu e-mail novamente gugapes@gmail.com.. GRATO ADIMINISTRADOR
Ei Luiz,
Este é um tema que tem sido muito debatido atualmente, e os questionamentos abordados são do cotidinao de todos, afinal a internete o mundo virtual já faz parte integrante dos nossos dias, o que resta é cada um se interrogar e ver se tem procurados amizades totalmente sem conteúdo, neste caso o melhor é ter bom senso.
Beijos.
Boa tarde Luiz,
gostei desse post.
É bom para refletir.
Queria te agradecer pelas palavras tão bonitas no meu blog.
Eu lembro bem o que me disse.
A amizade para mim é preciosidade. Ás vezes a gente deixa passar o que se precisa dizer por falta de oportunidade, tempo, mas quando o carinho é verdadeiro ela sempre volta.
Sempre achei que se deve olhar nos olhos do amigo e lhe dizer o quanto é preciosa sua amizade, sempre gostei de dizer o que penso e como não posso olhar nos teus olhos, escrevo.
Adoro tua amizade.
Beijo.
Fernanda
Pôxa virei sua fã..Repito o que disse no blog que te encontrei, num comentário..Gosto logo sigo..também te sigo com gosto!
Vou postar esse seu texto no meu facebook muito bom mesmo...essas redes sociais e suas implicações tem sido alvo de meu pensar e questionar ultimamente..
Espero sua visita nos meus blogs..o seu já é uma inspiração para mim
shalom
http://naimorbeck.blogspot.com/
http://nairmorbeck.blogspot.com/
Ganhamos conexões virtuais, mas realmente, perdemos as nossas conexões reais amo monte...
Fique com Deus, menino Luiz Neves.
Um abraço.
Um tanto pretensiosa essa análise das redes sociais, que são apenas ferramentas de comunicação que, como tantas outras dentro e fora da internet, podem ser bem ou mal usadas. Curioso é que a autora implica com a terminologia "amigo", usada no facebook e no orkut, mas cala sobre o termo "seguidor", usado no twitter e na maioria das ferraments de blog, mesmo sabendo que o termo original, "follower", há muito tempo tem conotação negativa no idioma inglês ...
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