ESCRITORES

ESCRITORES

A simplicidade desconcertante na linguagem poética de Dorival Caymmi

Dorival Caymmi
(...) Ai, se eu escutasse o que mamãe dizia:

“Bem, não vá deixar a sua mãe aflita

A gente faz o que o coração dita


Mas esse mundo é feito de maldade e ilusão” (...)




(Dorival Caymmi, em Saudade da Bahia)


Como explicar a simplicidade tão desconcertante em Dorival Caymmi? Se fizer bom tempo amanhã, eu vou. Mas se chover, não vou. E, de repente, parece que se abre o chão da lógica em que nossa linguagem estava erguida e nos vemos em um impasse, um susto, que é a luz de sua poesia. Marina, você se pintou; O mar, quando quebra na praia, é bonito; Se Anália não quiser ir, vou só; Coqueiro de Itapoã, coqueiro; areia de Itapoã, areia; morena de Itapoã, morena; saudade de Itapoã me deixa. Os versos, assim, aparentemente destituídos de tensões, tensionam-nos ao paroxismo, pela ausência de simploriedade. Eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim, vou ser sempre assim. A todo tempo, trabalham planos melódicos em notações triviais.
Dorival fez 101 músicas. A maioria, sucessos. Todas contendo essa alta concisão imagética e temporal, sem artifício, extravagância ou excesso de som e sentido. Sua espontaneidade deságua em uma espécie de sensualidade, de natureza filosófica, orgânica. O menino Caymmi cantava no coro da igreja, ouvia o gramofone da mãe, o pai tocando vários instrumentos em casa, lembrando histórias de bisavós italianos e africanos. Talvez venha da mistura afetuosa a sua Maracangalha de criatividade e leveza, o idílio de uma Bahia-ilha em mar imaginário, que faz mesmo pensar o que é que o baiano tem.

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